Nota do SPPD:  Somos uma única Família Humana – Dar voz às pessoas com deficiência – Covid19

Nota do Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência

 Somos uma única Família Humana

Dar voz às pessoas com deficiência – Covid19

 É preciso revigorar a consciência de que somos uma única família humana. Não há fronteiras nem barreiras políticas ou sociais que permitam isolar-nos e, por isso mesmo, também não há espaço para a globalização da indiferença. (L.S. 52)

 

Confiantes no amor de Deus, apaixonado pelo ser humano e pela criação fazemos eco e pretendemos de alguma forma concretizar a mensagem do Papa Francisco na Carta Encíclica Laudato Si.

Somos uma única família Humana exigência que nos leva, enquanto Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência, a ouvir e dar voz às pessoas com deficiência, em tempo de grande isolamento provocado pela pandemia Covid-19. Sabemos que, em muitos casos de pessoas com deficiência, as regras que devem ser adotadas para evitar o contágio são difíceis de cumprir e por vezes impraticáveis. Damos o exemplo da dificuldade de pessoas surdas ou com baixa audição, para quem o uso da máscara dificulta a compreensão da Língua Gestual Portuguesa e impossibilita a leitura labial. Também há reações emocionais que surgem fruto das medidas de isolamento ou quarentena.

Em tempos “normais” as pessoas com limitações de vária índole carecem de um contacto social espontâneo e simples e de um reconhecimento do seu valor e das suas necessidades o que, devido ao confinamento da maior parte das pessoas de referência, tem sido particularmente difícil, ampliando o isolamento de crianças, jovens, adultos com deficiência[1] e suas famílias.

Durante todo o tempo de isolamento pela pandemia, os equipamentos de apoio social e as escolas ficaram fechados e começam a abrir com muitas limitações. São, em muitos casos, o único momento em que os pais, e, em especial, as mães de pessoas com deficiência, têm algum tempo para si e para reelaborar o que vivem.

 Alguns quotidianos são mesmo muito difíceis e, ouvimos o grito de uma mãe, “nós, pais, somos confrontados com os nossos limites. Alguns dos nossos filhos têm comportamentos difíceis de controlar expondo-se a perigos, exigindo uma atenção permanente e muito desgastante. Precisamos de apoio de mãos concretas para executar as tarefas mais simples e precisamos de amigos que escutem”.

Nas famílias, antes do confinamento, corria-se duma terapia para a outra para a pessoa com deficiência ter oportunidade de ser a mais estimulada possível por “especialistas”. “Varriam-se para debaixo do tapete”, todas as questões existenciais que se colocam aos pais e à própria criança e mais tarde pessoa adulta: o porquê das limitações indisfarçáveis; o porquê a mim? De quem a/s culpa/s? E isto na situação em que a criança teve direito a nascer…

Para que haja um processo de reelaboração do que se vive, encontrando sentidos e conseguir ultrapassar frustrações e decepções, é necessário que os adultos cuidadores sejam acompanhados e “cuidados” por alguém atento. Há amigos que conseguem fazê-lo, mas é preciso que a Igreja descubra e assuma a importância e a responsabilidade por ouvir o grito, acolher e acompanhar estas pessoas… Se o confinamento em casa com crianças, com teletrabalho e todas as outras obrigações não é fácil, o sentir-se ignorado nas necessidades acrescidas deste grupo, agrava os riscos todos que estas famílias vivem.

A atenção às necessidades de todos os membros da família pode resultar numa tensão acrescida, sem uma pausa retemperadora que permita ao pai e à mãe reencontrar-se e “escolher o seu próprio caminho[2]”: escolher alegrar-se com um progresso inesperado, escolher perder tempo a brincar, jogar, com o filho (criança ou adulto), ou o marido, ou a mulher, ou os pais e descobrir a sua beleza interior e tudo o que se ganha com a sua presença e receber dele(s) a força para continuar”.

 É indispensável um “olhar exterior que nos dá força para aproveitar as ocasiões de exercer a autonomia possível dos nossos filhos”, diz-nos a Alice. “Ter alguém que olha o nosso filho nas suas potencialidades e nos ajuda a fixar aí o nosso olhar, a reconhecer o seu papel ativo na relação, mesmo à distância, pode fazer toda a diferença”.

Vencendo a indiferença e aproximando-nos das pessoas com deficiência, aprendemos a receber os dons que na sua singularidade e diversidade têm para nos dar; aprendemos com a sua vida e com a sua participação que a sociedade pode ser um lugar de partilha e pertença sem fronteiras nem barreiras; aprendemos que Somos uma única Família Humana.

03/06/2020

A Direção Nacional

Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência

[1] No preâmbulo da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU-2006) a deficiência é entendida como um conceito em evolução que “resulta da interacção entre pessoas com incapacidades e barreiras comportamentais e ambientais que impedem a sua participação plena e efectiva na sociedade em condições de igualdade com as outras pessoas”

No Art1º, é estabelecido que pessoas com deficiência são aquelas “que têm incapacidades duradouras físicas, mentais, intelectuais ou sensoriais que, em interacção com várias barreiras, podem impedir a sua plena e efectiva participação na sociedade em condições de igualdade”.

Este é um grupo considerável da população mundial, estimando-se que cerca de 15 % da população mundial tenha algum tipo de deficiência ( World Health Organization. World report on disability. Geneva; 2011).

[2] Vitor E. Frankl, O Homem em busca de sentido, Lua de Papel, 2012

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